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PR: Mãe desabafa um mês após morte do filho em ataque à escola

No dia 19 de junho de 2023, uma tragédia abalou o município de Cambé, na região metropolitana de Londrina, no Paraná. Um homem de 21 anos entrou no Colégio Estadual Professora Helena Kolody, sob o pretexto de buscar alguns documentos, e disparou com arma de fogo contra dois estudantes, Karoline Verri Alves, de 17 anos, e Luan Augusto, 16 anos. A menina morreu na hora. O namorado foi socorrido e encaminhado ao hospital, mas morreu na madrugada do dia 20. O assassino foi preso e foi encontrado morto dois dias depois.

Nesta quarta-feira (19), dia em que se completa um mês do ataque à escola, Fernanda Vieira, mãe de Luan, fala pela primeira vez sobre a perda do filho. Em depoimento à Vogue, ela conta sua história, detalha o fatídico 19 de junho, e reflete sobre o processo de luto. Veja o relato a seguir:


Luan e Karoline Alves foram mortos em ataque à escola — Foto: Instagram
Luan e Karoline Alves foram mortos em ataque à escola — Foto: Instagram

 


“Eu e o pai do Luan começamos a namorar muito novinhos. Eu tinha 14 anos, e ele 18. Foi meu primeiro namorado. Não planejamos a gravidez, mas ele foi muito desejado após descobrirmos. No primeiro ultrassom o médico disse que era uma menina, eu até tinha comprado roupinhas rosas. Aí depois descobrimos que era o nosso Luan.

A gestação em si foi bem tranquila, até 41 semanas, e o nascimento foi lindo. Ele nasceu carequinha, branquinho… tão frágil, meu Deus. Lembro como se fosse ontem. E eu tinha medo também, porque era um ser humaninho que ia depender totalmente de mim. Ele era muito faminto e sempre priorizei livre demanda na amamentação. Amava esse momento só nosso.

Luan sempre foi uma criança muito amável, nunca nos deu trabalho, sempre foi amoroso. Que orgulho eu tenho do meu menino desde sempre! Quando bebê só chorava para ser alimentado e só dormia. Era sorridente, depois de adolescente que começou a ficar com aquela carinha de mais sério.

Eu e o pai nos separamos quando ele tinha 4 anos, mas sempre mantivemos uma boa relação. Desde os 13 anos ele morava com os avós, devido a eu trabalhar em Londrina, por comodidade e opção dele. E estava tudo bem pra nós. Nossa relação sempre se manteve firme e forte, os avós moravam bem pertinho de casa.

Sempre teve minha participação em tudo na vida dele. Algumas pessoas dizem que os avós o criaram e isso não é verdade. Até me deixa triste, sinto uma leve falta de empatia por alguns. Mas enfim.

“O dia que meu mundo caiu”

 

Estava trabalhando quando recebi a mensagem do pai dele dizendo que teve tiros na escola. Fui direto para a escola. Chegando lá não tive informações, após alguns momentos encontrei o avô desesperado, dizendo que o Luan foi encaminhado para o hospital. Fui junto com eles no mesmo carro.

Quando chegamos o Luan tinha acabado de dar entrada. Encontrei a ambulância que tinha levado ele, havia muito sangue. É muito angustiante ver tudo aquilo, é desesperador. O sangue do meu filho derramado. Após isso foi uma espera sem fim.

Quis vê-lo, parecia que eu ia ver outro alguém que não meu filho, que era tudo um engano, que aquilo não podia estar acontecendo. Ele naquela situação, todo inchado, dois tiros na cabeça.

Os médicos foram bem realistas. Disseram que o quadro era bem grave, que ele tinha que dar uma melhorada para entrar em cirurgia. Mas não houve melhora. Fique ali o tempo todo segurando a mão dele. As unhas estavam cheias de sangue, os olhos inchados. Nunca em toda minha vida vou esquecer disso.

Fiquei lá até às 23 horas. Em todo momento que o via conversava com ele, dizia que a mamãe estava ali, que ele tinha que reagir, que não queria perdê-lo.

Às 23 horas eu saí, me despedi e fui ao velório da Karol, da namorada dele, que infelizmente perdeu a vida instantaneamente. Fiquei lá um tempo e fui para a casa tomar um banho. Às 3 horas da manhã recebi a mensagem do pai dele para ir ao hospital. Chegando lá eu só olhei para ele e ele balançou a cabeça em forma de ‘não’. Meu filho teve uma parada cardiorrespiratória.

Fui vê-lo sem vida. Nunca imaginei passar por isso, ver o meu amor sem vida. Eu morri ali também. Uma parte de mim morreu.

Estava nas minhas mãos optar por doação de córneas e no começo não quis. Mas depois, pensando, achei que ele era um menino tão bom, iria gostar de ajudar outras pessoas.

Todos os dias após isso eu acordo pensando que podia ter sido tudo um pesadelo. Mas não, tudo foi real. Minhas manhãs são duras, doloridas. Acordo chorando e vou dormir chorando. Perdi meu filho, que mãe pensa em enterrar um filho? Está errada essa ordem.

Eu queria poder ter trocado com ele, daria minha vida por ele. Eu o amo tanto, sempre o amarei. Meu primeiro amor. Um menino doce que fazia só o bem para todos. Não merecia morrer dessa forma. Meu coração dói a todo instante, um vazio, uma angústia.

Estou tomando remédios para depressão e ansiedade. Estou tentando acreditar que Deus teve um propósito nisso tudo, estou me apegando a isso e orando sempre. Fiz um altar para ele do lado da minha cama. Todos os dia acendo uma vela e rezo por ele e pela Karol.

Só estou vivendo um dia após o outro, com todo esse sentimento dentro de mim. Tenho uma filha de 8 anos de um outro relacionamento. Sempre vou carregar essa dor, mas creio que vai se tornar mais leve. Vou viver e ser uma mãe boa para ela. Com muitas saudades do meu menino, como todos os dias. Sinto tanta falta.

Sempre ouço os áudios dele, as nossas conversas. Eu gosto muito de treinar musculação e ele tinha começado a treinar também, pegou gosto. Estava mudando o corpo e me mandava vídeos de treino, de alimentação, eu comprava todos os suplementos dele. Ele tinha até pagado um ano de academia antecipado, estava todo orgulhoso de seu processo de mudança. Ele era meu orgulho.

Agora o que me resta são lembranças, apenas. E um luto sem fim.”

Fernanda fala sobre o luto e como encontra forças para seguir — Foto: Arquivo Pessoal
Fernanda fala sobre o luto e como encontra forças para seguir — Foto: Arquivo Pessoal

Fernanda Vieira, em Depoimento a Kellen Rodrigues
https://vogue.globo.com/
Edição: Léo Vilhena | Rede GNI