Alexandre de Moraes colocou a República de joelhos

A noite de 16 de julho de 2025 não foi apenas mais uma página escrita nos anais da República. Foi uma cicatriz aberta no peito de uma nação democrática. Um ferimento institucional que ainda sangra. Uma noite escura em que o Supremo Tribunal Federal, por meio de um único de seus ministros, Alexandre de Moraes, decidiu reescrever, à caneta e sem consulta, os limites do poder político no Brasil.

Não, Moraes não baixou as portas do Congresso Nacional, não acorrentou fisicamente as cadeiras da Câmara e do Senado. Mas com o peso de uma liminar solitária, monocrática, fria, silenciosa, irreversível, impôs-se sobre 383 parlamentares eleitos pela soberania popular, sepultando, com tinta e toga, o mais fundamental princípio democrático: a vontade do povo expressa pelo voto.

O que se viu não foi uma mera decisão jurídica. Foi um ato de força institucional. Uma intervenção crua e desmedida invadindo e anulando o equilíbrio entre os Poderes. O Congresso, que representa diretamente o povo, havia rejeitado com larga maioria o aumento do IOF, imposto que atinge diretamente trabalhadores, empresários e consumidores em um momento de crise fiscal e desemprego em alta. A decisão fora clara, transparente, pública. Era o exercício legítimo do Poder Legislativo, em sua plenitude. E ainda assim, foi apagada com uma simples assinatura.

Se um só homem pode derrubar a decisão de centenas de representantes, para que serve então o Parlamento? Para que servem as urnas? De onde vem tanto poder de um único ministro do STF? Para que servem os congressistas brasileiros? Todos estamos reféns de um ditador togado, que sequer recebeu um voto?

Como aceitar, em uma democracia madura, que um ministro da Suprema Corte tenha poder para suspender os efeitos de uma deliberação soberana do Congresso Nacional, inventar e convocar uma audiência de conciliação e, mesmo diante do impasse entre os Poderes, simplesmente manter sua própria liminar, como se fosse o tutor da República, o árbitro supremo entre Legislativo e Executivo?

A democracia brasileira, outrora resistente às intempéries, vê-se agora afogada pela hipertrofia do Judiciário. O Supremo, criado para ser guardião da Constituição, se converte, paulatinamente, em seu reescritor informal da própria Constituição. Cada nova decisão monocrática acende uma fagulha de instabilidade, cada nova interpretação inovadora gera jurisprudência que não nasce do povo, mas da vontade isolada de um togado.

Frases de efeito que deveriam soar como alarmes cívicos ecoam pelos cantos do país, como se fossem lágrimas de desespero que ganham vozes:

Quando o Legislativo é dobrado pelo Judiciário, não há diálogo, há rendição.
A toga, que deveria proteger a Constituição, agora a interpreta conforme as conveniências do momento.
A República treme quando o medo de confrontar um ministro se torna maior do que a coragem de defender a democracia.
Liminares não são votos. E ministros não são oráculos da vontade popular.

E os Congressistas? O que fizeram diante dessa afronta? Correram para as redes sociais. Redigiram notas de repúdio. Fizeram discursos inflamados para os seus seguidores, acreditando que assim ficarão marcados como guerreiros para os anais da posteridade.

Mas não moveram uma vírgula contra a ordem do ministro. Nenhum pedido de impeachment. Nenhuma convocação emergencial. Nenhuma ação no Supremo para resgatar sua própria autoridade.

A inação virou norma e a indignação virou espetáculo.

O que vimos foi um Congresso acovardado. Um parlamento ajoelhado. Um Poder que, em vez de legislar ou parlar, se limita a lamentar e chorar.

A história ensina, em letras vermelhas de sangue, que o silêncio dos Poderes diante da usurpação de suas competências é o berço do autoritarismo.

Não aquele que chega de farda, mas o que se veste de legitimidade jurídica. O que chega sorrateiro, com votos individuais, decisões monocráticas e linguajar técnico que esconde intenções políticas.

Preste atenção no que vou afirmar: A democracia não se perde com um estrondo. Ela desaparece com o som suave da caneta e o silêncio dos covardes.

O Brasil, mais uma vez, testemunha a inversão de papéis.

O Poder que deveria guardar a Constituição age como autor da sua reinterpretação permanente.

O Poder que deveria legislar assiste, inerte, à sua própria amputação.

Se isso não é o prenúncio de uma ruptura silenciosa, é, ao menos, o ensaio para a tragédia.

O povo brasileiro exige muito mais do que palavras. Exige coragem. Exige ação. Exige limites claros.

Onde há concentração ilimitada de poder, não há justiça, há autoritarismo disfarçado de legalidade.

É preciso que o Brasil desperte, antes que as sombras se tornem permanentes.

A Constituição Federal não é um pergaminho simbólico. É o pacto fundante de uma República que jura manter a independência e a harmonia entre os Poderes. Hoje, essa harmonia está em frangalhos. E se o Congresso não se levantar agora, talvez não reste muito tempo antes que ele seja, de fato, apenas um cenário decorativo em um teatro de decisões unilaterais.

Se até o Congresso se cala diante de um só homem, quem irá calar esse homem quando ele decidir calar a nação inteira?

Léo Vilhena

Autor

  • "Os comentários constituem reflexões analíticas, sem objetivo de questionar as instituições democráticas. Fundamentam-se no direito à liberdade de expressão, assegurado pela Constituição Federal. A liberdade de expressão é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal brasileira, em seu artigo 5º, inciso IV, que afirma que "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato"


    O AUTOR | Fundador da Rede GNI, atuou como jornalista e repórter por 25 anos, com passagens pelas redações do Jornal Unidade CristãRevista MagazineRede CBCRede Brasil e Rede CBN/MS. Autor de diversos livros — impressos e e-books — recebeu o Prêmio de Jornalista Independente em 2017, concedido pela União Brasileira de Profissionais de Imprensa, pela reportagem “Samu – Uma Família de Socorristas”. Também foi agraciado com três Moções de Aplausos, concedidas pelas Câmaras Municipais de Porto Murtinho, Curitiba e Campo Grande.

    Foi o primeiro fotojornalista a chegar à Rodoferroviária de Curitiba, na madrugada de 5 de novembro de 2008, quando o corpo da menina Raquel Genofre foi encontrado abandonado sob a escada, dentro de uma mala.

    Em 2018, cobriu o Congresso Nacional.

    É formado em Teologia (Bacharelado, Mestrado e Doutorado), Psicologia (Bacharelado) e Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Realizou diversos cursos na área de Jornalismo, com destaque para o P-MBA em Inteligência Artificial para Negócios, pela Faculdade Saint Paul. Tem conhecimentos em Programação e Design, com domínio de WordPress, HTML e JavaScript.

    Aos 54 anos, é pai de sete filhos e avô de três netas. Atualmente, além de Editor-Chefe da Rede GNI, mantém a coluna Ponto de Vista, com artigos de opinião.


    NOTA | Para que fique bem claro: Utilizo a Inteligência Artificial em todos os meus textos, APENAS, para corrigir eventuais erros de gramática, ortografia e pontuações.

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