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Clássico da Agatha Christie ganha uma versão primorosa da BBC: ‘E não sobrou nenhum’

Uma verdadeira Obra-Prima da televisão mundial. A adaptação de O CASO DOS DEZ NEGRINHOS, livro com mais de 100 milhões de exemplares vendidos ao redor do mundo e escrito em 1939 pela genial Rainha do Crime, Agatha Christie (1890-1976) é uma das produções mais primorosas de todos os tempos.

Rebatizado para E Não Sobrou Nenhum, por causa do ‘politicamente correto, é um espetáculo da sétima arte.

A produção da BBC  é icônica e entra definitivamente para o rol das superproduções e exalta o texto de uma das arrepiantes jornadas mais conhecidas de Christie, O CASO DOS DEZ NEGRINHOS’.

Agatha Christie esbanja genialidade nesse livro, o mais impecável de toda a sua obra literária.


A minissérie de apenas três episódios, cada um com uma média de 53 minutos, não apenas capturou a essência dos personagens e da trama original, como fez um ótimo uso do drama familiar para construir um chocante tour-de-force do começo ao fim.

A adaptação mantém uma áurea de mistério e suspense do início ao fim, e temos que falar, é um final apoteótico.

Os cenários grandiosos, impetuosos, fascinantes, primam pela perfeição da ambientação do livro de maior sucesso de Agatha Christie.


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BBC assina acordo para adaptar mais sete obras de Agatha Christie


SINOPSE (Alerta de spoillers)

A história gira em torno de um grupo de dez pessoas que são convidadas pelos misteriosos, retraídos e talvez excêntricos Sr. e Sra. U.N. Owen, magnatas  donos de uma ilha intitulada Ilha do Negro, rebatizada de Ilha do Soldado.

Os oito personagens principais, além do casal de empregados, o casal ROGERS, recebem cartas estranhas, diferentes umas das outras, e são levados para o meio do oceano onde são recepcionados por um casal de empregados. Entretanto, os Owen não estão por ali e, conforme o primeiro dia chega ao fim, fica bem claro que as coisas não são exatamente o que parecem – e que eles podem ter sido atraídos para uma armadilha.

Um a um vão sendo caçados.


Logo de cara, fica claro para os telespectadores que a sinestesia aventuresca sempre presente nos romances de Christie deixa de existir em prol de uma brutalidade narrativa, uma aridez capturada com maestria pelas habilidades da roteirista Sarah Phelps. Afastando-se da apresentação sistemática dos protagonistas, como vemos no livro, o público é introduzido a uma agourenta e ambígua backstory estrelada por Vera Claythorne (Maeve Dermody) – que basicamente funciona como a heroína/final girl do show. De fato, não compreendemos exatamente o que está acontecendo, mas percebemos que ela está hesitante em aceitar o trabalho como secretária dos Owen ao descobrir que deverá viajar para a ilha devido a um trauma não muito remoto que continua a assombrá-la. Entretanto, ela decide acatar o novo emprego.

Pouco depois, Vera se encontra com os outros hóspedes, todos desconhecidos entre si que foram requisitados, cada qual para uma situação: o insuportável e infantil ator Anthony Marston (Douglas Booth), que tem irreverência de sobre para irritar todos os seus companheiros; o calculista juiz Lawrence Wargrave (Charles Dance); o histérico médico Edward Armstrong (Toby Stephens); a esnobe socialite Emily Brent (Miranda Richardson), entre outros. Cada um deles se porta com superioridade, tentando compreender e descobrir por conta própria quais os propósitos de seus anfitriões e porque escolheram pessoas tão diferentes entre si para visitarem a gigantesca mansão.


Pois bem, não demora muito até que descubram do que esse inexplicável jogo se trata: durante o primeiro jantar, o mordomo Thomas Rogers (Noah Taylor) coloca um velho disco para tocar, revelando os supostos crimes que cada um dos convidados cometeu – todos responsáveis pela morte de inocentes, mas nenhum deles tendo enfrentado as consequências de seus pecados e saído impunes. É claro que eles encaram aquilo como uma brincadeira de muito mal gosto e começam a desenvolver um ressentimento mortal pelos Owen; isso é, até Anthony tomar uma bebida envenenada e morrer engasgado com o próprio sangue.

Para aqueles que não estão familiarizados com a história original, os dez visitantes (os funcionários do casarão incluídos) começam a ser sumariamente eliminados pela ordem de uma antiga canção de ninar, uma espécie de trágico poema conhecido por Os Dez Negrinhos, rebatizado para Os Dez Soldadinhos – uma adaptação menos controversa que Os Dez Negrinhos, presente no romance original que foi modificado por seu caráter supostamente racista. Aqui, os dez soldados titulares vão perecendo verso após verso, até que sobre apenas um (que se enforca por não ter outra escolha). Após Anthony e a empregada Ethel Rogers (Anna Maxwell Martin) morrerem misteriosamente na mesma noite, Vera começa a acreditar que há um assassino entre eles e que o texto infantil pode não ser só ficção.


A minissérie, assim como o livro, não se restringem apenas ao nicho mercadológico do suspense e do mistério, mas abrem suas portas para uma análise profunda da condição humana dentro do espectro da autopreservação: conforme nos aproximamos do último episódio, percebemos que as vítimas, na verdade, são os verdadeiros antagonistas da trama, construções egoístas, odiosas e tardiamente arrependidas que nada mais são que uma extensão da nossa própria sociedade. E é isso que permite que essa produção vá muito mais além do que esperaríamos.

Se o roteiro se encontra numa perfeição quase onírica, a estética visual e performática também segue no mesmo caminho. Dermody e Richardson, por exemplo, se isolam em duas personalidades extremas que revelam suas verdadeiras facetas nos momentos de maior tensão. Da mesma forma, as reviravoltas e os crimes nunca são expostos cenicamente, preferindo utilizarem-se do foreshadowing e de sutilezas que contribuem para o clímax e a supressão de qualquer esperança para Vera, a única sobrevivente. Diferente das estórias protagonizadas por Hercule Poirot e Miss Marple, não há alguém que miraculosamente virá salvá-los ou resolver o crime: eles estão sozinhos, encarcerados em um melancólico pano de fundo cuja ruína é premeditada desde o princípio.


‘E Não Sobrou Nenhum’ é uma das melhores adaptações dos escritos de Agatha Christie e, sem dúvida alguma, uma das minisséries mais competentes e bem-estruturadas da televisão contemporânea. É claro que ela não está livre de certos deslizes, mas sua envolvente condução e sua fusão entre drama e misticismo felizmente falam bem mais alto.

Edição e Acréscimo de texto: Léo Vilhena
Twitter: https://twitter.com/LeoVilhena50
Texto original (Sinopse) de Thiago Nolla


NOTA: Oficialmente, o título em francês vinha do original em inglês, “Ten Little Niggers” – OS DEZ NEGRINHOS, publicado em 1939. O nome do romance policial foi alterado no Reino Unido nos anos 1980 por conta das conotações ligadas à palavra em inglês “nigger“, em português Negro, e virou “And Then There Were None” (E não sobrou nenhum). Vale ressaltar que Agatha Christie jamais foi considerada racista e na época em que o livro foi escrito era normal a referencia à negros ou negrinhos, sem nenhuma conotação racista. Mas o ‘politicamente correto’ alterou o título original de uma das maiores obras literárias de todos os tempos.

Léo Vilhena
Jornalista


Resenha] O Caso dos Dez Negrinhos – Agatha Christie – Daniela Colaci

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