Por que a Papuda se tornou o símbolo da punição política no Brasil
Últimas atualizações em 26/10/2025 – 23:05 Por Gazeta do Povo | Feed
Em meio à indefinição da participação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux no julgamento dos recursos da defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), volta a chamar a atenção um local que é ícone no imaginário nacional, geralmente visto como símbolo da punição a políticos de diversos matizes ideológicos. Trata-se do Complexo Penitenciário da Papuda, o principal presídio do Distrito Federal.
Afinal, após o término das discussões no STF, onde Fux foi o único divergente na Primeira Turma, não é o mais provável, mas tampouco impossível, que o ex-presidente seja mandado para a Papuda a fim de cumprir inicialmente sua pena em regime fechado. Atualmente, Bolsonaro cumpre a prisão domiciliar provisória. No Supremo, Fux teve a autorização do presidente Edson Fachin para migrar para Segunda Turma, mas deve permanecer entre os ministros responsáveis pelo julgamento de Bolsonaro.
A Papuda já recebeu governadores, ministros, senadores, deputados federais e distritais, secretários de estado e funcionários públicos de diversos níveis hierárquicos ao longo de sua história, das administrações locais e federal — invariavelmente em casos relacionados a corrupção — além de empresários, celebridades, maníacos, traficantes, terroristas internacionais e líderes de facções criminosas, entre outros — mas nunca um ex-presidente.
O complexo prisional já abrigou políticos como os ex-deputados federais José Dirceu e José Genoíno, ambos do PT e condenados no caso do Mensalão. Condenado a sete anos e 11 meses de prisão por corrupção ativa, Dirceu ficou 11 meses em regime fechado na Papuda até ser autorizado pelo STF a cumprir a pena em casa. Genoíno também foi condenado a quatro anos e oito meses e cumpriu parte desta pena na Papuda até ser liberado para cumprir o restante da pena em casa.
O ex-governador e prefeito de São Paulo, Paulo Maluf (Progressistas) foi transferido para a Papuda em 22 de dezembro de 2017. Ele havia se entregado à PF em São Paulo dois dias antes, após uma decisão do ministro Edson Fachin, do STF, que determinou o início imediato do cumprimento da pena a que foi condenado por lavagem de dinheiro. Em 30 de março de 2018, o STF autorizou que ele cumprisse o restante da pena de sete anos e nove meses em prisão domiciliar. A condenação se refere a desvios de recursos de obras públicas na construção da avenida Água Espraiada, atual avenida Roberto Marinho, na capital paulista, quando ele foi prefeito (1993-1996), e o envio ilegal desses valores ao exterior.
Já o ex-deputado federal Natan Donadon foi o primeiro parlamentar em exercício preso por uma determinação do STF desde a promulgação da Constituição em 1988. Ele foi condenado a 13 anos e quatro meses pelos crimes de peculato e formação de quadrilha, em 2013. Em julho de 2015, ele progrediu para o regime semiaberto e, em 2019, teve a pena extinta.
O Distrito Federal, por sua vez, já teve três ex-governadores presos no local. José Roberto Arruda, governador de 2007 a 2010, ficou preso ali duas vezes: a primeira em 2010 no contexto da operação Caixa de Pandora e, posteriormente, em 2017 na operação Panatenaico, sobre fraudes na reforma do estádio Mané Garrincha. Agnelo Queiroz (PT), governador de 2011 a 2014, foi preso em 2017, também na operação Panatenaico, que investigava desvios na reforma do Mané Garrincha. Joaquim Roriz chegou a ser preso na Papuda em 2007, após renunciar ao mandato de senador em meio ao escândalo do caso Bezerra de Ouro, mas a prisão foi revogada pouco depois.
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De acordo com apuração do jornal O Globo publicada nesta quinta-feira (23) o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, está confiante na manutenção da prisão domiciliar para Bolsonaro. Segundo o jornal, o chefe do PL tem dito em Brasília que em casa e com as visitas controladas pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, Bolsonaro perdeu visibilidade. Levado para a prisão, mobilizaria apoiadores e voltaria ao centro das atenções.
Para o vereador paulistano Adrilles Jorge (União Brasil), a discussão é secundária na medida em que o ex-presidente já está preso, e em sua visão isso não pode permanecer em primeiro lugar. “Ele não vai ser preso, já está preso, incomunicável, sem acesso, trancado em casa”, afirma o vereador à Gazeta do Povo. “Não existe ação judicial contra o Bolsonaro, existe ação ditatorial em cima dele. São juízes sancionados internacionalmente que rasgaram as leis para colocar o maior líder político da direita na cadeia, e tudo indica que ele vai continuar preso.”
A deputada federal Rosana Valle (PL) vê o PL unido em torno de uma solução política para o ex-presidente e acredita que a revolta seria grande em caso dele ir para a cadeia. “Prender Bolsonaro seria mais um golpe na confiança do povo nas instituições. O Brasil não aguenta mais perseguições. A nação precisa de equilíbrio e de Justiça verdadeira”, diz a deputada.
A Papuda também foi o destino dos presos pelo ato do 8 de janeiro de 2023, sendo que a permanência dos manifestantes na penitenciária até o julgamento pelo STF foi criticada por advogados e pela oposição no Congresso. O caso mais emblemático foi do empresário baiano Cleriston Pereira da Cunha, o Clezão, que morreu na Papuda, em 2023, após um mal súbito.
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Ex-presidentes nunca passaram pela Papuda
Caso a ida de Bolsonaro para a Papuda para cumprir a pena inicialmente em regime fechado se concretize, seria a primeira vez que o presídio abriga um ex-presidente da República pelo menos desde o fim do regime militar e a redemocratização, no final dos anos 1980. Nas vezes em que foram parar na cadeia, outros três ex-presidentes nunca ficaram lá.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cumpriu 580 dias de prisão em uma sala adaptada na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba após ser condenado a 12 anos e um mês de prisão no caso do triplex do Guarujá, em 2018 — posteriormente, a partir de 2021, o STF anulou todas as penas e processos contra Lula na operação Lava Jato.
O ex-presidente Michel Temer, por sua vez, passou quatro noites preso na Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro antes de ser solto com um habeas corpus concedido pela Justiça Federal. Temer foi preso a mando do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, dentro da operação Descontaminação, desmembramento da operação Radioatividade, no âmbito da Lava Jato no estado. Em 2022, ele e outros sete acusados no caso foram absolvidos das acusações de corrupção e lavagem de dinheiro.
Por fim, o ex-presidente Fernando Collor de Mello (PRD) foi transferido para prisão domiciliar após uma semana cumprindo pena em regime fechado no presídio Baldomero Cavalcanti de Oliveira, em Maceió, em maio deste ano. Collor, que cumpre pena de 8 anos e 10 meses pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, tem que usar tornozeleira eletrônica e só pode receber visitas de seus advogados.
O ex-presidente foi condenado pelo STF em maio de 2023, em um processo que teve origem na operação Lava Jato. A corte considerou que Collor, como dirigente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), foi responsável pelas indicações políticas para a BR Distribuidora, então estatal subsidiária da Petrobras, e teria recebido R$ 20 milhões em vantagens indevidas em contratos da empresa, entre 2010 e 2014.
Em novembro do ano passado, o STF manteve a condenação, depois de rejeitar os recursos da defesa para reformar a condenação. No dia 24 de abril deste ano, Moraes rejeitou um segundo recurso da defesa e determinou a prisão imediata do ex-presidente. A prisão domiciliar foi pedida pela defesa do ex-presidente, sob a justificativa de problemas de saúde crônicos como apneia do sono, doença de Parkinson e transtorno afetivo bipolar, além de sua idade avançada — ele tem 75 anos.
“As situações jurídicas do Lula e do Bolsonaro são diferentes […] A prisão do Lula era provisória, a do Bolsonaro é definitiva já que não cabem mais recursos após o STF”, afirma à Gazeta do Povo o advogado Arthur Rollo.
“Se a gente for comparar, temos que comparar com o Collor, que também tem condenação definitiva, também tem doenças e condições de saúde, e o STF concedeu a ele a prisão domiciliar. Esse precedente se aplica ao Bolsonaro”, avalia.
“Ao que me consta, ele tem seguido à risca as determinações do ministro Alexandre de Moraes, como por exemplo não receber visitas sem autorização judicial, ficar em casa e outras restrições, não tentou fugir”, completa o advogado. Dessa forma, o jurista acredita que o ex-presidente cumpre os requisitos para permanecer na prisão domiciliar — caso haja alguma violação das regras estabelecidas para tanto, poderia ser mandado para a cadeia a qualquer momento.
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