Manobras e recursos podem levar julgamento de Bolsonaro a 2026

Últimas atualizações em 28/08/2025 – 03:17 Por Gazeta do Povo | Feed

Apesar de agendado para o período que vai de 2 a 12 de setembro deste ano, algumas manobras – como o pedido de vista de algum ministro e recursos no Supremo Tribunal Federal (STF) – podem levar o resultado do julgamento do Núcleo 1 da suposta tentativa de golpe de Estado, que inclui o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e mais sete réus, para o ano de 2026. O que mais impactaria o julgamento seria um pedido de vista. Cogitava-se que esse pedido poderia vir do ministro Luiz Fux, mas ele afirmou, por ora, que não deverá fazê-lo, embora essa formalização possa ocorrer durante os dias do julgamento.

O pedido de vista tem previsão regimental de 90 dias e pode ser prorrogado por mais 30 – o que resulta em até quatro meses de análise extra do processo. Além dele, existem manobras, regras regimentais e recursos que podem protelar o trânsito em julgado.

Para alguns analistas, há um “clima de perseguição”, especialmente após o novo indiciamento pela Polícia Federal na semana passada por outra questão, que dá indícios de que o julgamento sobre o suposto golpe de Estado possa se encerrar em setembro deste ano, com o trânsito em julgado até o fim de 2025. Porém, eles também consideram algumas medidas que possam estender a decisão para o ano de eleições presidenciais.

Bolsonaro e os outros sete réus que integram o “núcleo crucial” da suposta trama golpista, conforme denominado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), serão julgados pela Primeira Turma do STF, que é composta pelos ministros Cristiano Zanin (presidente), Alexandre de Moraes (relator), Cármen Lúcia, Flávio Dino e Luiz Fux. Se condenado, Bolsonaro pode ser sentenciado em até 43 anos de reclusão.

“O próprio Supremo Tribunal Federal quer encerrar ainda neste ano, mas o julgamento pode, sim, se estender até o ano que vem por algumas circunstâncias, como recursos, principalmente se houver pedido de vista”, avalia o constitucionalista Alessandro Chiarottino.

Segundo o procurador-jurídico da Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim), Marcio Berti, é possível que o desfecho – com trânsito em julgado – fique para o próximo ano, em razão de prazos recursais, somado à possibilidade de vista e eventuais manobras regimentais.

O criminalista Gauthama Fornaciari, da Gauthama Fornaciari Advogados, chama a atenção para eventualidades envolvendo desde o mencionado pedido de vista até os embargos infringentes das defesas, que ocorrem após a decisão de possíveis condenações e que podem levar semanas para serem analisados. Isso também poderia levar o processo para 2026.

“Existem prazos que podem, de fato, postergar a decisão e colocar o trânsito em julgado entre o fim do primeiro trimestre e até mesmo no fim do primeiro semestre do próximo ano”.

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Circunstâncias que podem estender o julgamento até o próximo ano

Os especialistas traçaram uma possível linha do tempo após o início do julgamento em 2 de setembro de 2025.

1. Julgamento no STF sem pedido de vista

Se nenhum ministro pedir vista, o julgamento pode terminar em setembro de 2025 mesmo. Caso haja pedido de vista, o regimento interno do STF prevê até 90 dias de prazo, prorrogáveis por mais 30, o que pode jogar a retomada da análise do caso na Primeira Turma do STF para janeiro/fevereiro de 2026, após o recesso do Judiciário. A depender da dinâmica, o voto-vista pode ser devolvido no início de 2026, e o julgamento seria retomado em fevereiro ou março.

2. Pedido de embargos de declaração

No caso de não haver pedidos de vista e ocorrer o julgamento com condenação, os réus podem apresentar embargos de declaração, nos quais pedem esclarecimentos de omissões ou contradições da decisão. Segundo os juristas, isso costuma adiar o trânsito em julgado por semanas ou até mesmo meses, a depender da análise dos pedidos feitos pelas defesas.

Dependendo do placar e da decisão do julgamento, pode haver discussão sobre efeitos práticos da condenação, o que também pode estender os prazos que levam às possíveis condenações.

Os embargos de declaração são um recurso que serve para pedir ao juiz ou tribunal que esclareça algo, elimine contradições, corrija omissões ou erros simples em suas decisões, mas isso ocorre após o julgamento.

São previstos no Código de Processo Penal (CPP) e no Código de Processo Civil (CPC). Eles são julgados pelo mesmo órgão que proferiu a sentença, neste caso, a própria Primeira Turma do STF. Eles interrompem o prazo para outros recursos, mas, em regra, não suspendem o andamento do processo.

3. Tentativas de recursos extraordinários

Como se trata do STF, não há recurso para instância superior, mas os réus que são condenados ainda podem tentar recursos internos, como embargos infringentes em caso de placar apertado, o que não é dado como provável, mas, se ocorrer, esse caso também poderia adiar ainda a conclusão definitiva.

“Embora o STF esteja claramente tentando acelerar o julgamento com sessões extraordinárias em setembro, não há garantia que o processo termine ainda em 2025. A combinação de pedidos de vista, embargos e prazos regimentais pode, sim, empurrar a decisão final para 2026, especialmente se houver articulações protelatórias”, afirma o criminalista Marcio Nunes.

Os embargos infringentes são um recurso previsto no Código de Processo Penal (art. 609), utilizado pela defesa quando uma decisão colegiada não é unânime e é desfavorável ao réu, ou seja, quando ocorre a condenação. Basta que haja apenas um voto divergente para que o réu possa apresentar esse recurso na tentativa de reanalisar os pontos controversos. Comumente esse recurso também é julgado pela própria Turma, mas há juristas que alertam sobre a possibilidade de eles serem levados ao colegiado, ou seja, para apreciação dos 11 ministros da Corte.

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Em 2 de setembro de 2025, o julgamento vai começar no STF com sessão da Primeira Turma, onde o processo do suposto golpe é julgado. Os votos podem ser lidos rapidamente, ou se estender por vários dias. O presidente da Turma, Cristiano Zanin, reservou as sessões no período de 2 a 12 de setembro para esse julgamento.

Se existir consenso e não houver pedido de vista, o julgamento pode ser concluído no mesmo mês. Se isso se confirmar, entre setembro/outubro abrem-se os prazos para apresentação de embargos de declaração, após a decretação da sentença.

Nesse cenário, nos meses de outubro/novembro ocorreria o julgamento dos embargos de declaração e o trânsito em julgado se daria ainda no fim de 2025.

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Possíveis datas se houver pedido de vista

Se houver pedido de vista, antes ou no decorrer do julgamento, o Regimento Interno do STF permite até 90 dias renováveis por mais 30 dias de prazo, chegando assim a 120 dias. Se todo o prazo for utilizado pelo ministro que pedir vista, a ação poderá ser devolvida até janeiro/fevereiro de 2026, com retomada e conclusão do julgamento entre fevereiro e março do próximo ano.

Nesse cenário, em março/abril de 2026, irão se abrir os prazos para apresentação de embargos de declaração; entre abril/maio de 2026 seria o julgamento dos embargos; e em maio/junho de 2026 ocorreria o trânsito em julgado – já às vésperas do processo eleitoral de 2026.

O doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e comentarista político Luiz Augusto Módolo classificou o andamento do processo no STF como “a toque de caixa e infundado”, por julgar não haver provas ou indicações de uma efetiva tentativa para golpe de Estado. O especialista afirmou se tratar de um julgamento político e sugeriu que o ministro Luiz Fux, apesar de manifestações recentes de que não pretende pedir vista, poderia fazê-lo, adiando o desfecho.

“A tramitação tem sido célere demais se comparada a outros casos no STF. Alguns processos envolvendo figuras políticas ficaram parados por anos, muitos prescreveram. Corrupção, como foram alguns casos, também é um ataque às instituições, mas não tem o mesmo tratamento […] No caso de Bolsonaro, se trata de um julgamento político e todos sabem que ele será condenado”, opina.

Julgamento de Bolsonaro concluído em 2026 beneficiaria Lula em disputa presidencial

Apesar do esforço do STF em acelerar o julgamento do Núcleo 1 da suposta tentativa de golpe de Estado, as chances de o julgamento se estender a 2026 beneficiariam politicamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na disputa eleitoral do próximo ano, avaliam especialistas.

Vale ressaltar que Bolsonaro está inelegível até 2030 por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Corte concluiu, em junho de 2023, que o ex-presidente cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação ao convocar embaixadores, em julho de 2022, para criticar o sistema eletrônico de votação.

A decisão não tem relação com as investigações sobre o suposto golpe de Estado após as eleições de 2022. Assim, independente do resultado do julgamento que vai começar na próxima semana na Primeira Turma do STF, ele segue sem condições de disputar o pleito de 2026 por conta da decisão tomada pelo TSE.

O constitucionalista André Marsiglia analisa que a estratégia de deixar o fim do julgamento para 2026 pode ser uma expectativa clara do Partido dos Trabalhadores (PT) para desgastar, ao máximo, a imagem do ex-presidente, que, apesar de estar inelegível, é um dos principais nomes da direita e deve ter influência na escolha do candidato desse espectro político para a disputa do próximo ano.

Além disso, mesmo não podendo concorrer, existe a possibilidade de Bolsonaro postergar a escolha do sucessor e seguir sustentando que pode ser cotado à disputa. Nesse cenário, se o julgamento se arrastar, o próprio PT apostaria no desgaste da direita e em erros estratégicos, como o que o próprio Partido dos Trabalhadores julgou cometer em 2018, quando a legenda esquerdista manteve Lula candidato até o último momento, para só então lançar Fernando Haddad em seu lugar. Haddad saiu derrotado justamente por Jair Bolsonaro, à época no PSL.

Nessa conjuntura hipotética, segundo Marsiglia, a expectativa da esquerda seria de que o desgaste da imagem de Bolsonaro e o resultado do julgamento sobre o suposto golpe de Estado saíssem às vésperas das eleições de 2026, levando a direita a uma desarticulação, beneficiando Lula de forma direta.

O especialista analisa que a “esquerda estaria torcendo” para que ocorra o pedido de vista no julgamento, o que arrastaria o processo por meses. Marsiglia – que analisa a ação penal do suposto golpe de Estado como inconstitucional e tem feito duras críticas à condução do processo pelo ministro Alexandre de Moraes e o STF – afirma que o processo nem sequer deveria estar em pauta. Ele contesta os crimes que foram atribuídos aos réus e as provas apresentadas pela acusação.

“O julgamento nem sequer deveria estar ocorrendo, mas um adiamento só favorece a esquerda e o PT, pois adia uma solução definitiva se a candidatura de Bolsonaro será ou não viabilizada. A situação atual de Bolsonaro, preso em casa, sem poder falar, é ruim, não há por que postergar [a decisão no STF]”.

Luiz Augusto Módolo também destaca que Moraes quer celeridade no julgamento de Bolsonaro, mas há o risco de o processo se arrastar. Mas, segundo ele, não deve passar 2026, já que ele avalia que há um fundo político, mirando as eleições do próximo ano.

O especialista criticou o que considera ser o uso político da situação por setores da esquerda. “Eles [partidos de esquerda] capitalizam tudo em seu favor. Isso seria só mais um caso, tendo em vista que, com um resultado [do julgamento] em 2026, poderia beneficiar politicamente a esquerda na disputa eleitoral”.

“Tudo o que [o ministro Alexandre de] Moraes não queria: uma eleição à sombra do julgamento. Por outro lado, há movimentos que indicam que a própria esquerda estaria torcendo para que o processo se arraste”, afirmou. Ele ainda reforçou que manobras jurídicas também podem empurrar a conclusão do processo para o próximo ano.

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Nas alegações finais entregues ao STF no início de agosto, última etapa antes do julgamento, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro pediu a absolvição e destacou que considerava que havia graves falhas processuais e ausência de provas que conectassem o ex-mandatário a atos criminosos.

Os advogados alegaram que houve cerceamento de defesa, falta de provas sobre o envolvimento de Bolsonaro em planos supostamente golpistas e salientaram a efetiva colaboração para a transição de governo. Eles também pediram a nulidade da delação do ex-ajudante de ordens Mauro Cid.

Além de Bolsonaro, integram o Núcleo 1 o ex-ajudante de ordens Mauro Cid; Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin; Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça; Augusto Heleno, ex-ministro do GSI; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; e Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022. Todos negam que houve tentativa de golpe de Estado e participação em atos ilegais, e alegam cerceamento do direito de defesa em razão da dificuldade de acessar as provas.

Os réus respondem por tentativa de acabar com o Estado Democrático de Direito de forma violenta. O fato ocorre quando alguém, usando força ou ameaça grave, tenta impedir ou limitar o funcionamento dos poderes estabelecidos pela Constituição — esse ato pode levar a uma pena de quatro a oito anos de prisão.

Eles também respondem por golpe de Estado, crime que se caracteriza quando há uma tentativa de derrubar, também por violência ou ameaça, um governo eleito de forma legítima, com punição que varia entre quatro e 12 anos de reclusão.

No caso de organização criminosa, a lei define como a união de quatro ou mais pessoas, com estrutura e divisão de tarefas, para praticar crimes, sendo prevista pena de três a oito anos.

O dano qualificado, outro crime pelo qual os réus respondem, é a destruição ou deterioração de algo pertencente a outra pessoa, especialmente quando envolve violência, ameaça e causa prejuízo relevante ao patrimônio da União, o que pode resultar em pena de seis meses a três anos.

Por fim, a deterioração de patrimônio tombado se refere à destruição ou dano a bens protegidos legalmente, sendo punida com reclusão de um a três anos.

Os outros três núcleos ainda não têm data definida para os julgamentos. No total, são 31 réus que respondem por esses crimes na ação penal.

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