Projeto que limita ações de partidos nanicos no STF ganha força

Últimas atualizações em 17/07/2025 – 18:11 Por Gazeta do Povo | Feed

A judicialização da crise política sobre o IOF pode escalar para uma proposta que esvazia os partidos nanicos do Congresso Nacional. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), quer retomar a discussão de uma proposta que dificulta que siglas com baixa representatividade recorram ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra leis e medidas dos parlamentares. Para isso, ele conta com o apoio de partidos do Centrão – legendas com maioria nas duas Casas do Legislativo.

A reação passou a ser costurada depois que o PSOL foi à Corte para questionar a decisão da Câmara e do Senado de derrubarem o decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O partido de esquerda recorreu da decisão antes mesmo do próprio Executivo, que levou o pedido ao STF por meio da Advocacia-Geral da União (AGU) em 1º de julho.

Após suspender tanto o decreto da gestão petista quanto o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) do Congresso, o ministro Alexandre de Moraes determinou que as partes tentassem chegar a um consenso sobre questão. Mas a tentativa de conciliação terminou sem acordo entre Legislativo e Executivo, e Moraes decidiu a favor do governo. Ele liberou o aumento do IOF, mas impediu a cobrança do imposto sobre operações do “risco sacado” – modalidade de crédito em que bancos antecipam valores para varejistas.

Antes mesmo dessa decisão, Alcolumbre já havia se manifestado sobre a necessidade de o Congresso discutir quais partidos podem recorrer ao STF para tentar derrubar medidas aprovadas pela Câmara e pelo Senado.

“Temos que discutir com urgência, no Congresso brasileiro, em relação aos legitimados que podem acessar o Supremo Tribunal Federal para questionar qualquer lei votada no Congresso. Esse é um problema seríssimo que temos no Brasil”, declarou Alcolumbre.

A decisão do Legislativo que aprovou o Projeto do Decreto Legislativo (PDL) para derrubar o aumento do IOF proposto pelo governo Lula tinha sido tomada por 383 deputados votos a favor na Câmara e apenas 98 contrários. No Senado, a votação aconteceu de forma simbólica, apenas o Partido dos Trabalhadores (PT) e do líder do Partido Democrático Trabalhista (PDT), Weverton Rocha (MA), foram contrários à medida.

“As críticas ao Judiciário são fruto daqueles que vão e procuram o Judiciário, como no IOF, que foi um partido político que entrou com o primeiro questionamento. Em seguida, a AGU, com legitimidade e com prerrogativa [também recorreu à Corte]”, completou Alcolumbre. 

Antes do PSOL e da AGU, a questão do IOF chegou a ser levada ao STF por meio de uma ação apresentada pelo PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro. A sigla, no entanto, questionou o decreto editado por Lula para aumentar o imposto e não a decisão do Congresso de derrubá-la.

Nesse cenário, o ministro Alexandre de Moraes, que já havia sido designado relator do pedido do PL, também acabou assumindo as relatorias das ações apresentadas pelo PSOL e pelo governo federal sobre o IOF.

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Movimento contra nanicos conta com apoio de Hugo Motta na Câmara 

Alcolumbre apresentou ao Colégio de Líderes uma proposta de sua autoria para limitar que os partidos com baixa representatividade usem o mecanismo para questionar decisões do Congresso no STF. O presidente do Senado chegou a tratar sobre o tema com os seus pares nos últimos dias e a expectativa é de que a questão comece a ser discutida pela Casa em agosto, após o recesso parlamentar.

Senadores ouvidos pela reportagem avaliam que a medida conta com a simpatia dos líderes das principais bancadas da Casa e também deve atrair o apoio do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Hoje, a lista de quem pode propor as chamadas ADIs (ações diretas de inconstitucionalidade) ao STF inclui partidos políticos, governadores, Assembleias Legislativas, confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.

Além desses, o presidente da República, o Senado Federal, a Câmara dos Deputados, a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também têm legitimidade para acionar o STF. “Hoje está muito aberto, e todo mundo pode questionar uma legislação votada pelo Parlamento brasileiro”, criticou Alcolumbre. 

Defensor da proposta, o senador Márcior Bittar (União-AC) argumenta que o mecanismo da ADI tem sido usado de forma desproporcional, “especialmente por legendas de esquerda”. “Um partido para acionar o Supremo Tribunal Federal tem que ter um tamanho mínimo, o mesmo exigido para acesso ao fundo partidário e ao tempo de TV. Não é possível manter partidos que nem sequer têm voto suficiente apenas para judicializar decisões legítimas tomadas por esta Casa”, defendeu Bittar. 

Os moldes da proposta de Alcolumbre ainda serão tratados em reunião com o Colégio de Líderes do Senado. Paralelamente, líderes do Centrão defendem a possibilidade de resgatar uma proposta que está engavetada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), relatada pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP). 

A proposta original prevê que os partidos com legitimidade para recorrer ao STF seriam aqueles que atingissem a chamada cláusula de barreira. Se a regra fosse aprovada, 16 partidos e federações não poderiam ingressar com ações na Corte. São eles: Avante, PSC, Solidariedade, Patriota, PTB, Novo e PROS.

Outra possibilidade discutida seria restringir o direito de acionar o STF apenas aos partidos com pelo menos 15 deputados. Nesse cenário, a federação PSOL-Rede também seria prejudicada.

Para Abhner Arabi, professor de Direito Constitucional na Universidade Mackenzie Alphaville, a discussão no Congresso não seria uma violação dos direitos constitucionais.

“Quanto aos direitos constitucionais afetados, como o acesso à justiça, não me parece haver uma violação, desde que os requisitos sejam válidos e proporcionais. O pluralismo político, um valor importante da Constituição, também não seria se os requisitos forem válidos. A questão central é a de que os próprios órgãos políticos levam ao Supremo questões que, muitas vezes, deveriam ser resolvidas na arena política, e o projeto busca justamente um equilíbrio”, explicou o professor. 

Partidos de esquerda lideram questionamentos feitos ao STF 

De 2019 a 2025, pelo menos 723 ações foram apresentadas ao Supremo por partidos políticos, segundo levantamento do portal g1. Os dados apontam que essas legendas foram responsáveis por pouco mais de 28% dos 2,5 mil questionamentos de leis ou regulamentos apresentados à Corte. 

A Rede Sustentabilidade, por exemplo, apresentou 113 ações, enquanto o PT foi responsável por 103 pedidos, seguido pelo PDT e pelo PSOL, com 102 cada. A lista conta ainda com PSB (93); Partido Verde (60); PCdoB (53); Solidariedade (45). Já no campo da direita e centro-direita, aparecem o Novo (32) e o Progressistas (27).

Ex-presidente da Câmara e defensor da proposta de limitação dos partidos, o deputado Arthur Lira (PP-AL) afirmou que é preciso que o Legislativo “faça o dever de casa”.  “Aprovar modificações na lei para que matérias que são aprovadas por maioria absoluta – como qualquer uma que ultrapasse 350, 380 [votos] – não sejam contestadas por minorias insatisfeitas. A legislação permite isso por enquanto e eu espero que ela seja modificada”, disse. 

Em contrapartida, o presidente do partido Novo, Eduardo Ribeiro, classificou a medida como uma afronta direta à Constituição e um ataque ao pluralismo político no Brasil. Segundo ele, o fortalecimento do Congresso não se deve dar às custas da diversidade partidária.  

“Se o objetivo é fortalecer o papel do Congresso, que o Parlamento então exerça sua função constitucional de conter abusos de autoridade e o ativismo judicial por meio dos instrumentos institucionais que já possui e não cerceando ainda mais a diversidade representativa do próprio Legislativo”, disse. 

Para Arabi, esse é um tema que gera muitos debates na teoria constitucional. O que me parece adequado é uma espécie de equilíbrio. “Por um lado, é fundamental que haja autocontenção do próprio Supremo e uma deferência institucional ao Poder Legislativo e, por vezes, ao Poder Executivo, como instâncias mais adequadas para discutir e resolver certas questões políticas”, explica.  

“Por outro lado, o Supremo, quando provocado como órgão do Poder Judiciário, é obrigado a dar uma solução adequada à questão que lhe foi levada, com base nas normas constitucionais. Existe uma fronteira próxima e tênue entre o que é política e o que é Direito Constitucional. Considerando que há necessidade de autocontenção, mas que os próprios órgãos políticos levam essas questões ao Supremo, esse equilíbrio é crucial. Talvez esse projeto de lei seja uma etapa importante para amadurecer essa questão na democracia constitucional brasileira”, ressalta. 

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