Tarcísio se equilibra para agradar a direita e não incomodar o STF

Últimas atualizações em 16/07/2025 – 21:26 Por Gazeta do Povo | Feed

Após reforçar acenos à direita nas últimas semanas, o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), enfrenta pressões dentro desse espectro político ao mesmo tempo em que busca manter bom trânsito no Supremo Tribunal Federal (STF). As críticas de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) à negociação do governo paulista para tentar reduzir as tarifas dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros expuseram as dificuldades de Tarcísio em se consolidar como herdeiro político do ex-presidente enquanto tenta atrair eleitores de centro-direita que não se identificam com ele.

Desde a manifestação na Avenida Paulista, em 29 de junho, o governador de São Paulo intensificou as defesas públicas de Jair Bolsonaro e afirmou que “não há democracia quando se retira uma pessoa das urnas”. 

Na semana passada, responsabilizou a política externa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela taxação de 50% imposta pelos Estados Unidos a produtos brasileiros. “Lula colocou sua ideologia acima da economia, e esse é o resultado”, disse Tarcísio em publicação no X.

Mas, na segunda-feira (14), sinalizou para uma direita não necessariamente entusiasta de Bolsonaro ao receber empresários paulistas no Palácio dos Bandeirantes e prometer “diálogo firme” com os EUA para tentar reduzir os impactos das tarifas, movimento visto por aliados como uma tentativa de demonstrar pragmatismo e defesa do setor produtivo.

No entanto, a iniciativa de tentar o diálogo com Washington irritou Eduardo Bolsonaro, que classificou a negociação como “um desrespeito” e “um erro” do governador. Eduardo quer concentrar as negociações porque está nos Estados Unidos e afirma ter contato direto com a Casa Branca.

Apesar das críticas, nos bastidores da oposição, a aproximação do governador com empresários e sua postura considerada moderada seguem sendo vistas como trunfos para ampliar sua base de apoio, inclusive dentro do Partido Liberal, caso Tarcísio avance como potencial candidato presidencial em 2026. 

Um dos desafios de Tarcísio será manter os acenos à direita sem tensionar a relação com o STF, onde preserva diálogo com o ministro Alexandre de Moraes e busca evitar novos confrontos judiciais que possam desgastar seu capital político.

O cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), destaca que Tarcísio reúne importantes condições que o colocam como o principal nome da direita para disputar a Presidência em 2026. Ele apoiou o ex-presidente, mesmo em momentos bastante difíceis, e por mais que tenha alguma resistência dentro dos círculos chamados de “mais ideologizados”, ele “é um nome de relativo consenso tanto para os atores do centro como para o próprio Bolsonaro e sua família”, afirmou.

Gomes destaca que, ao contrário dos outros governadores que pretendem disputar o Palácio do Planalto, o chefe do Executivo paulista possui bom trânsito político e visibilidade nacional devido ao estado que governa. “Ele não teria que percorrer a mesma rota para se tornar conhecido nacionalmente, como seria preciso para outros nomes, e tenderá a ficar ainda mais conhecido”, pontuou Gomes.

Para o cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec de Belo Horizonte, o maior “trunfo” de Tarcísio é unir o apoio dos eleitores de Bolsonaro a uma imagem mais “moderada”, capaz de atrair quem não vota no ex-presidente.

“Muito do credenciamento dele como candidato se deve ao fato de ser quem mais se aproximou e se manteve próximo de Bolsonaro. Ao mesmo tempo, ele conseguiu preservar um lado mais moderado, que agrada a quem se opôs ao governo Lula, mas também não quer Bolsonaro na urna”, afirmou Cerqueira.

Para Cerqueira, Tarcísio já ocupa uma posição confortável e deve manter sua estratégia. “O jogo do Tarcísio é continuar como está. Ele tem o apoio do Bolsonaro, a confiança do eleitorado [fiel ao ex-presidente] e já conquistou espaço de reconhecimento no centro”, destacou.

Na sexta-feira (4), Tarcísio chegou a dizer que é “extremamente perigoso” para o Brasil se alinhar com países do Sul Global – estratégia adotada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A declaração é vista como um aceno à base mais conservadora da direita, que possui críticas ao multilateralismo defendido pelo petista.

“A gente está falando de países que têm uma grande fragilidade, que é justamente a fragilidade democrática, a falta de democracia. E isso, talvez, nos afaste dos maiores investidores e dos melhores mercados. É como se a gente tivesse um estoque de capital gigantesco para competir e a gente estivesse restringindo as nossas possibilidades a uma parcela muito ínfima, muito pequena desse capital”, disse o governador.

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Conquistar o eleitor mediano será decisivo para Tarcísio

Para ter viabilidade em uma possível candidatura presidencial, Tarcísio de Freitas precisará ajustar seu discurso para conquistar o chamado “eleitor mediano”, avalia o cientista político Antônio Henrique Lucena, professor da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).

“Na teoria política, já está bem consolidado que, para que uma pessoa consiga se eleger, ela precisa atingir o que a gente chama de “eleitor mediano”. Então, ele precisa fazer um discurso que atinja a maior parte da população”, explicou.

Lucena observa que adotar um discurso totalmente voltado à direita reduziria as chances de Tarcísio em uma disputa nacional. “Ele não pode fazer um discurso demais de um lado, seja direita ou esquerda, porque vai reduzir as chances de competir”, afirmou.

Para o cientista político, pautas como economia, segurança pública e valores conservadores em costumes podem ser estratégias, desde que equilibradas com respeito às instituições, evitando confrontos com o Supremo Tribunal Federal. “A campanha do candidato tem que saber pesar e dosar exatamente os aspectos, nem muito de um lado, nem muito do outro”, alertou.

Segundo Lucena, o caminho de Tarcísio deve incluir não apenas a mobilização da direita, mas também a busca por votos em setores de centro-direita e até de centro-esquerda descontentes com o governo Lula. “Ele precisa, além de conquistar os votos da direita, também buscar parcelas da centro-esquerda desiludidas com o governo”, avaliou.

“Bom trânsito” de Tarcísio no STF gera críticas de parte da direita

Tarcísio foi criticado por fotos em que aparece ao lado de ministros do STF. Em novembro de 2022, ele foi fotografado ao lado do ministro Luís Roberto Barroso em um jantar. Sobre o caso, ele disse que a organização das mesas ficou a cargo do evento e que não havia escolhido o lugar. Por outro lado, afirmou que adotaria estratégia diferente da usada no governo Bolsonaro em relação ao Judiciário.

“Vamos conversar com ministros do STF. E Barroso é um ministro preparadíssimo, razoável. Sempre que eu, na condição de ministro [da Infraestrutura de Bolsonaro], precisei dele, ele ajudou o ministério. Sempre votou a favor das nossas demandas”, disse Tarcísio em entrevista ao canal CNN Brasil.

Em dezembro, o governador foi visto em conversa amistosa com Moraes durante a posse dos ministros indicados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), Messod Azulay Neto e Paulo Sérgio Domingues. Em reserva, uma fonte próxima a Tarcísio confirmou à Gazeta do Povo que o gestor paulista e o ministro sempre tiveram um bom relacionamento, mesmo durante os momentos mais críticos envolvendo o governo Bolsonaro.

O tratamento dado por Moraes a Tarcísio durante as investigações da suposta tentativa de golpe de Estado é visto como um forte indício desse relacionamento. Ao prestar depoimento sobre o caso, em maio, o governador permaneceu apenas oito minutos em audiência com Moraes, que não realizou perguntas a Tarcísio. A postura do ministro do STF surpreendeu, considerando que ele sempre adotou uma atitude mais dura com investigados e outras testemunhas.

Apoio à Reforma Tributária e políticas LGBTs geram tensão

Divergências em pautas de economia e costumes também foram expostas na relação da direita com Tarcísio. Um dos episódios mais emblemáticos ocorreu quando o governador elogiou a Reforma Tributária em um evento ao lado de Baleia Rossi, presidente do MDB, e à época mais próximo de Lula.

Na época, durante a articulação da proposta no Congresso, Tarcísio declarou, ao lado do ministro Fernando Haddad, que “apoiava 95% da reforma”. A fala gerou críticas de sua base.

Outro ponto de atrito foi um edital da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo para fomentar projetos culturais voltados à população LGBT, o que gerou críticas de deputados conservadores, que acusaram o governo de “ceder à agenda progressista”.

A tensão aumentou em abril de 2024, quando a Secretaria de Estado da Saúde publicou uma resolução criando diretrizes para a Política Estadual de Saúde Integral da População LGBT+. O texto previa ações como o “fortalecimento do processo transexualizador” no SUS paulista e atendimento especializado a crianças e adolescentes LGBT. Após forte pressão de parlamentares da base, como do deputado estadual Gil Diniz (PL), a resolução foi revogada.

“Fico satisfeito por o governador ter ouvido nosso apelo e revogado a Resolução 89. Entrarei com um Projeto de Decreto Legislativo para extinguir o comitê que elaborou esse documento. Nossa prioridade em São Paulo é o fortalecimento das famílias, e não a sexualização precoce de nossas crianças e adolescentes”, afirmou o deputado ao jornal O Globo na época.

Mas como Tarcísio de Freitas é visto pelos parlamentares aliados de Bolsonaro?

Expressões como “bom gestor”, “leal a Bolsonaro”, “preparado” e “burocrata” aparecem em conversas reservadas com deputados da oposição, tanto dos mais próximos ao ex-presidente quanto do centro.

Pesquisa da Genial/Quaest mostrou que 49% dos deputados federais entrevistados veem Tarcísio como o principal nome da direita, um aumento de 10 pontos em relação ao levantamento anterior, de maio de 2024. O instituto entrevistou 203 deputados federais, entre 7 de maio de 30 de junho. A margem de erro é de 4,5 pontos percentuais, para mais ou para menos.

Por outro lado, os congressistas reconhecem que não poderão contar com o governador para pautas de costume mais sensíveis, exceto em temas ligados à segurança pública. Para um deputado do PL que adota um discurso mais crítico, a candidatura do ex-ministro é “o que tem para hoje”.

Na avaliação desse parlamentar, Tarcísio é a opção da direita para voltar ao poder e conter o avanço da esquerda no país. Na visão dele, em um hipotético governo de Tarcísio no Palácio do Planalto, pautas como o combate à ideologia de gênero poderão ficar em segundo plano. Para ele, será preciso aguardar um presidente de direita que seja “mais combativo” com relação a esses temas.

Sobre o STF, esse mesmo deputado avalia que Tarcísio não enfrentará os ministros, já que mantém boa relação com a maioria da Corte. No entanto, caso seja eleito, a expectativa é de que ele não “impeça” a oposição de pautar pedidos de impeachment de ministros, caso o Senado seja controlado pela direita.

Mesmo assim, a oposição dá como certo que Tarcísio concederá anistia aos presos do 8 de janeiro e a Bolsonaro, caso assuma a Presidência da República.

Outro ponto que gerou críticas, em dezembro de 2022, foi quando Tarcísio disse que nunca foi “bolsonarista raiz” e que não quer entrar em uma “guerra ideológica” em seu governo.

“Eu nunca fui bolsonarista raiz. Comungo das ideias econômicas, principalmente, desse governo Bolsonaro. A valorização da livre iniciativa, os estímulos ao empreendedorismo, a busca do capital privado, a visão liberal”, disse, em entrevista à CNN Brasil. “Sou cristão, contra o aborto, contra a liberação de drogas, mas não vou entrar em guerra ideológica e cultural.”

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