Dino quer PGR vigiando redes enquanto Congresso não as regula
Últimas atualizações em 11/06/2025 – 15:14 Por Gazeta do Povo | Feed
O ministro Flávio Dino apresentou nesta terça-feira (11) seu voto no julgamento que pode redefinir as regras da internet no Brasil, sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet. Ele defendeu a inconstitucionalidade parcial do dispositivo e sugeriu que a Procuradoria-Geral da República (PGR) atue como órgão fiscalizador da atuação das plataformas enquanto o Congresso não aprova uma lei de regulação das redes.
O artigo 19 estabelece que plataformas só podem ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros se houver descumprimento de uma ordem judicial de remoção. Para Dino, as plataformas devem passar a ser responsabilizadas se não agirem proativamente para remover, entre outras coisas, conteúdos que façam apologia ou instiguem violência contra o Estado Democrático de Direito.
Juristas têm apontado à Gazeta do Povo que formulações vagas desse tipo podem incentivar a remoção de críticas políticas legítimas, sufocando a liberdade de expressão.
O voto de Dino acompanha, em parte, os de Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, ao propor mudanças que transferem às plataformas o dever de vigiar os usuários, sob pena de sanções. Até agora, cada ministro defendeu um modelo diferente de regulação, enquanto André Mendonça divergiu e votou pela constitucionalidade da atual lei.
Para Dino, o artigo 19 seria mantido apenas para casos de crimes contra a honra, como calúnia e difamação. Em todos os demais tipos de conteúdo, as plataformas poderiam ser punidas mesmo sem ordem judicial, a depender da categoria do conteúdo, da forma como foi publicado e de uma série de deveres que Dino propôs impor às empresas.
O primeiro desses deveres é o de agir preventivamente contra perfis falsos ou automatizados. Dino defende que contas anônimas ou bots violam o princípio de vedação ao anonimato previsto na Constituição, e por isso devem gerar responsabilidade direta das plataformas. O segundo caso é o de publicações pagas ou patrocinadas. Para o ministro, se há lucro com um conteúdo considerado ilegal, não é necessário aguardar decisão judicial para remover e punir.
Dino também propõe que conteúdos considerados manifestamente ilícitos possam ser removidos sem ordem judicial. Ele divide esses casos em quatro categorias: crimes contra crianças e adolescentes; crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio ou à automutilação; crime de terrorismo; e, como já mencionado, o de “fazer apologia ou instigar violência, ou grave ameaça, visando à prática dos crimes contra o Estado Democrático”.
Como justificativa para esse novo modelo, Dino cita o artigo 21 do Marco Civil da Internet, que já permite a responsabilização das plataformas sem decisão judicial em casos de divulgação não autorizada de imagens íntimas. Para ele, essa exceção prevista na lei mostra que o regime do artigo 19 não é absoluto e que outras exceções também podem ser estabelecidas. Ele propõe usar o artigo 21 para englobar novas exceções.
Dino quer, além disso, criar a figura da “falha sistêmica” como critério para punir plataformas. Nesse modelo, as redes não seriam punidas por casos isolados, mas sim quando houver tolerância reiterada aos tipos de conteúdo vedados.
O ministro também propõe que as plataformas adotem um modelo de autorregulação obrigatória, com “um sistema de notificações, um devido processo e relatórios anuais de transparência em relação a notificações extrajudiciais, anúncios e impulsionamento”.
Na prática, o voto impõe às plataformas digitais, sob pressão do Estado, o dever de remover os conteúdos incluídos no rol de proibições definido por Dino. Enquanto o Congresso não aprovar uma nova legislação, caberia à PGR supervisionar esse modelo de responsabilização.
Ao final do voto de Dino, o presidente do STF, Barroso, fez um comentário sinalizando discordar do ministro nesse ponto, ao afirmar que prefere a atuação de “uma entidade privada que pudesse representar perante o Judiciário, para que o Judiciário tomasse as decisões”.
Em geral, a lógica proposta por Dino segue a mesma linha dos votos de Barroso, Fux e Toffoli. Como apontaram diversos juristas à Gazeta do Povo ao longo do debate sobre a derrubada do artigo 19 do Marco Civil, o modelo que os ministros propõem pode estimular as plataformas a errar por excesso, removendo preventivamente qualquer conteúdo que possa gerar risco de responsabilização. O resultado poderá ser um ambiente favorável à censura prévia, especialmente em temas de natureza política ou ideológica.
O voto de Dino se alinha mais ao de Barroso, ao propor a inconstitucionalidade parcial do artigo 19 e permitir a responsabilização direta das plataformas em casos graves. A principal diferença é que Dino sugere a figura da “falha sistêmica” e atribui à PGR a supervisão do sistema. Já Toffoli e Fux defenderam modelos mais duros, com remoção baseada em meras notificações privadas.
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